Quando eu estava grávida, ficava imaginando como seria o futuro, acho que é o que mais fazemos, nesse período, sonhamos com o futuro. Já contei aqui que passei toda a minha gestação tensa por conta de uma gravidez anterior que perdi, a cada exame que eu ia fazer , eu ia preocupada com o resultado e sempre voltava aliviada. Me lembro de quando fui fazer o ultrassom de translucência nucal com 12 semanas, lembro que a médica disse que poderia apontar a síndrome de down nesse exame, fui tensa mas depois fiquei aliviada quando o resultado: deu normal. Quando fui fazer a ultrassom morfológica, como fiquei aliviada ao saber que ele tinha a formação perfeita, acho que é uma preocupação de quase todas as mulheres. E quando ele nasceu, depois de fazer o teste do pezinho, orelhinha e do olhinho, como fiquei mais aliviada ainda por saber que tudo era normal. Meu filho era "perfeito". Ufa! Que alívio! Agora tudo deu certo.
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Pois é, mal sabia eu, o que viria ainda pela frente. Sem saber de nada eu achava que se tudo estava normal nos exames eu não tinha mais com o que me preocupar. Eu olhava para o meu filho como uma mãe super apaixonada e ele era (é) tão lindo, na verdade era perfeito demais pra mim que sempre tive tudo tão difícil na minha vida. Parecia que não... sei lá, como eu disse era perfeito demais pra mim. O Miguel andou com um ano e três meses, e eu me preocupei um pouquinho porque achava que estava demorando um pouquinho mas a pediatra disse que até um ano e seis meses é considerado tempo normal. Mas quando começou a andar eu falei "Graças a Deus", meu filho é perfeito sim.
A fala começou a aparecer antes de um ano e tudo parecia muito normal, mas de repente aquele alívio de ter o filho normal, passou a dar lugar a preocupação.
Depois desse tempo, o que ele falava foi sumindo e a única coisa que ele falava ainda era "mamã" de mamãe. De repente alguns outros sintomas do autismo que até então eu nem desconfiava começou a aparecer. E quando vimos depois dos dois anos, ele não atendia mais quando o chamávamos, e não brincava com outras crianças, parou de ter contato visual, e só brincava enfileirando coisas, e aquele som único mas maravilhoso de "mamã" também sumiu. Idas e vindas em consultas e terapias e a ficha cai, meu filho não era "perfeito" como eu achava, mas espera aí, o que é ser perfeito? E de repente depois de um bom tempo aprendo várias coisas com meu filho autista, eu mudei a concepção de "perfeito", de repente minha definição para essa palavra é outra. No dicionário Aurélio diz que Perfeito é acabado, rematado, completo, sem defeito, magistral, primoroso; e meu filho é tudo isso, para as demais pessoas ser perfeito é não ter deficiência, mas para mãe de criança especial, ser perfeito é ser nosso filho, e é quando percebemos que nosso filho é perfeito assim , do jeitinho dele. Não mudaria nada no meu filho, claro que se me fosse perguntado antes se ele deveria ser autista ou não, eu diria que não, mas se me desse a opção de só tê-lo autista eu teria meu filho mil vezes.
Autismo não é fácil, ser mãe especial é um desafio, mas tem seu lado maravilhoso, o autismo não é, mas meu filho sim é maravilhoso, aprendo tantas coisas todos os dias. O autismo é algo ainda com muitas facetas a ser descobertas... ao mesmo tempo, acho fascinante as variações psíquicas, a imensa delicadeza, a notória sensibilidade ... o esforço que os autistas fazem por se integrarem ao nosso¨ mundo. Hoje sei que aquela frase que sempre dizemos quando nos perguntam se queremos um menino ou menina e respondemos "Qualquer um, o importante é que venha com saúde", é pra la´de importante, realmente saúde é tudo, e se não vier com saúde, vamos amar e viver da melhor maneira possível do mesmo jeito. Na verdade, até a minha definição de saúde mudou, para mim ter saúde é não ter uma doença terminal, meu filho é autista mas é saudável, e aliás ninguém está livre de repente a doença terminal bater na sua porta, por isso vamos aproveitar enquanto podemos, abraçar, beijar e amassar muito quem amamos.
Aprendi a valorizar coisas que para as outras mães são normais. Quem presta atenção em como é legal o fato de ser filho ter aprendido a sugar o canudo do suco de primeira tentativa? Quem acha lindo e incrível ver seu filho puxando a mochila de rodinhas certinho no primeiro dia que a professora ensinou? Quem comemora quando seu filho aceitar comer algo novo? Isso tudo é corriqueiro na vida de outras mulheres, mas pra nós isso é tão importante ... valorizo cada conquista, e elas são árduas, mas valem cada esforço empregado e assim todos os dias tenho o que comemorar. Sei que não posso ficar infeliz com o que possivelmente não virá.
Mesmo que as vezes eu me questiono se estou fazendo a coisa certa e se estou sendo uma boa mãe para meu filho, no fundo sei que estou fazendo tudo o que posso e que a unica vez em que fiz algo prejudicial ao meu filho foi quando dei muito ouvido a palpites que iam contra o meu instinto materno; ninguém conhece meu filho tão bem quanto eu, e por isso confio nos meus instintos com relação a ele. Descobri que ser mãe aumentou minha capacidade criativa, pensativa, reflexos e até dotes culinários, aliás de repente virei especialista em várias áreas, desde enfermagem a culinária, a maternidade especial só me fez melhorar.
E quando digo melhorar, é que eu sempre falo isso e repito, sou muito mais humana agora, percebo muito mais a importância de cada pessoa e aprendi a olhar com amor a outras crianças especiais,
não com pena, como muitos que estão de fora olham, mas com amor e querendo dizer, se precisar eu estou aqui, conte comigo. é incrível como sinto um amor tão grande por uma criança especial que acabei de conhecer, na verdade nem sei explicar isso, afinal eu agora entendo que todo mundo merece e quer ser respeitado e acima de tudo ser feliz. Aliás não existe família perfeita, cada um tem um problema, só é diferente um dos outros, olhar para o outro com ternura e ser gentil, é necessário, porque eu nunca sei a dor que o outro pode estar carregando. E se a capacidade de interpretar choro de criança é um gene único de mães que é ativado na hora do parto; agora já sei que há um outro muito mais especial capaz de decifrar um olhar quando meu filho não fala, ler expressão corporal então, sou especialista. Basta me olhar e sei o que quer ou o que precisa. Nunca ouvi um " Mamãe eu te amo " e talvez nunca ouça... mas não tem preço receber inesperadamente um cheiro...afago nos cabelos ou ser acordada ou surpreendida com não um, mas vários beijos ... O medo que temos do futuro pode ser superado se paramos de pensar nele o tempo todo, talvez meu filho nunca faça uma faculdade, e se torne um advogado por exemplo ... mas tenho a certeza que nunca terei que visitar meu filho na cadeia ou chorar de desgosto por vê-lo tratando uma outra pessoa com desprezo de quem se acha melhor que o outro. Acredito que com todas as suas limitações estejam mais próximos da perfeição que eu. Afinal, uma criança que me ensina tantas coisas porque não seria perfeita? eu que não sou perfeita quando deixo meu lado incompreensível com o próximo ser mais forte. De todas as coisas que eu aprendi depois do meu filho eu sempre falo que a "paciência" é meu maior aprendizado, e as vezes vejo que sou "muito" mais forte do que eu imaginava que fosse mas se tem uma coisa que percebi é que a vida nos presenteia com coisas maravilhosas e no meu caso, esse presente é o meu Miguel! Ele me ajuda todos os dias a ser um ser humano melhor.
Apesar de todo o trabalho que dá e do cansaço que bate quando estamos cuidando do nosso filho, não tem como não concordar: como dizem "amor de mãe é incondicional" uma experiência incrível que somente quando a gente tem um filho consegue entender, sendo especial ou não. E ele... Ah, tenho certeza que ele tem dado passos bem mais largos que o meu! Amo meu filho assim, perfeito do jeitinho dele.
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