quinta-feira, 28 de julho de 2016

Interação Social no autismo? É possível!



A parte social do autista é uma das mais afetadas e geralmente até os autistas mais leves, os chamados de auto funcionamento ou asperges tem dificuldades na interação social. Me lembro que, quando os primeiros sinais de autismo começou a aparecer no Miguel, embora eu não tivesse ideia que era autismo, morávamos em um apartamento e quase não saiamos de casa, eu sempre fui muito caseira. Percebemos que o Miguel não gostava muito de visitas, parecia incomodado e sempre ficava chorando. Achávamos que era porque ele não estava acostumado. Ele não tinha primos da mesma idade e por isso não tinha crianças por perto para brincar, os primos de perto eram já pré-adolescentes mas o Miguel se interessava mais em ficar com eles do que quando encontrávamos alguma criança da mesma idade dele, hoje sei que as crianças autistas têm mais dificuldades de relacionamento com crianças da mesma idade, geralmente com crianças mais velhas eles interagem melhor. 

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Com o passar do tempo, esse comportamento foi ficando cada vez mais visível, o Miguel não brincava com outras crianças e por não falar, a interação fica mais difícil ainda. Uma criança interage com a outra porque brincam da mesma maneira, no caso dos meninos, fazem pistas de carrinhos, brincam com manobras radicais com esses carrinhos, enquanto o Miguel só queria enfileirar os carrinhos e ficava bravo se outra criança pegava o carrinho do local que ele colocou, ou seja, ficava difícil a brincadeira. Isso sem falar quando uma criança vem conversar com ele e óbvio que ele não responde. então a criança desiste e afasta-se. Algumas vezes as pessoas citam como o autista não querendo uma interação social, eu discordo disso, acho que eles sentem dificuldades nessa interação, isso não significa que seja impossível ou que eles não queiram , apenas não sabem como agir e é nesse ponto que quero chegar. 

Com quase quatro anos o Miguel começa a ir para a escola, embora o toque não seja problema para ele, pelo contrário, ele até gosta de tocar nas pessoas, adora abraços e beijos com pessoas mais familiarizadas, ele ainda não brincava com outras crianças. Como muitas outras coisas, depois da escola a interação social do Miguel melhorou incrivelmente. Claro que contei com a ajuda das professoras que souberam incluir o Miguel muito bem e de repente pude notar alguns detalhes. Sempre que saímos no bairro acabávamos encontrando um amiguinho da escola que dizia "Oi Miguel" embora ele não respondesse, as vezes nem mesmo olhava para o amiguinho, eles sempre o cumprimentava, quando levávamos o Miguel na sala de aula, ele era recebido por todos amiguinhos que o cumprimentavam e o tratavam com muito carinho e compreensão em até uma especie de proteção, o que eu achava incrível.

O Miguel se diverte muito com essa prima.
Nessa mesma época, uma priminha cresceu um pouquinho e veio a fase que ela poderia brincar com ele e também até de uma prima 5 anos mais velha que ele, o Miguel se aproximou bastante, e começou  brincar de correr, e a abraçá-la sempre que a via. Hoje ele adora essa prima. Esse ano ele estuda em uma escola para autistas e recentemente  me chamaram para conversar porque querem que o Miguel vá para uma escola regular também, já que é uma das únicas crianças da sala que procuram bastante as outras crianças para brincar, estas porém, também são autistas e brincam sozinhas. Com o tempo, o Miguel foi aceitando melhor as visitas em casas, algumas vezes ele ainda puxa a visita pela mão para fora quando chega rsrsrs mas isso é menos frequente. Essa semana, minha mãe ficou alguns dias em casa com meus irmãos e meu padastro, e eu estava percebendo exatamente sobre isso, minha irmã tem dez anos e o Miguel adora  brincar com ela, aliás é um chicletinho atrás dela e do meu irmão do meio também. Na inicio da semana, foram embora e só ficou meu irmão, e o Miguel se apegou a ele, quando acorda, a primeira coisa que ele faz é ir deitar com meu irmão, passa o dia chamando-o para brincar, puxando ele pela mão e balbuciando o "mamo" de "vamos", uma das duas únicas palavras que ele fala.

Trabalhe com seu filho a interação, será um trabalho de formiguinha, dia após dia, aos poucos, não tente forçar de uma vez a interação, é preciso compreender a dificuldade do autista em interagir, não é que ele prefira ficar ou brincar sozinho, como eu disse, as vezes a maneira diferente dele brincar pode acabar sendo mais um fator a dificultar. Incentive em brincadeiras coletivas como na piscina, ou se seu filho gosta de correr, estimule com a brincadeira pega-pega, ou se ele gosta de cócegas, brinque de cócegas e ensine a outra criança que quer brincar com seu filho como agir. Uma priminha do Miguel brinca muito com cócegas com ele porque sabe que ele adora e assim os dois se divertem juntos. Com adultos a interação deveria ser mais fácil, mas muitas vezes o adulto que deveria compreender a criança autista acaba complicando, muitos nem mesmo cumprimentam nossos filhos, mas se resolvem dar uma atenção com muita paciência, acabam conquistando nossos pequenos. 

Qualidade da foto ruim, mas tem duvida
 que ele adora a prima?
Um ponto importante que não posso deixar de citar aqui é a maneira que o autista procura a interação que muitas vezes não é compreendida. Sempre que chega uma criança perto do Miguel, ele sorri e empurra a criança. Conversei com as terapeutas e elas me afirmaram o que eu já imaginava, ele não está empurrando por maldade, é a maneira dele interagir, como ele não fala, fica muito mais difícil pra ele iniciar uma brincadeira, e por isso o "empurrar" pra ele é um convite à brincadeira. O problema é que o Miguel é uma criança grande para a idade e esse empurrão em uma criança menor que ele, pode ser perigoso, por isso temos que estar atento e é claro que os pais da outra criança pode interpretar como uma agressão e isso só complica. Sempre que ele empurra, eu falo que não é assim que se inicia uma brincadeira e tento orientá-lo.  É preciso um trabalho em parceria com os terapeutas e professores, o objetivo é inspirar a criança com dificuldades de interação e comunicação para que ela queira interagir conosco e, dentro desta interação prazerosa, aprenda novas habilidades. Quanto mais motivadora e divertida for a interação, maior a chance da criança permanecer espontaneamente na atividade conosco. Ao construirmos a interação, procuramos ajudar a criança a ficar altamente motivada por nossa ação. Oferecemos com empolgação alguma ação divertida baseada nas motivações e interesses da criança. Então se a criança gosta de música, por exemplo, nós podemos cantar, dançar e tocar algum instrumento musical. Se ela gosta de pular, nós a convidamos para brincar de pular. Quando a criança já estiver altamente motivada por nossa ação, começamos a solicitar algo desafiador para ela. Por exemplo, o adulto faz cócegas (ação motivadora) várias vezes na criança sem pedir nada para ela. Apenas quando a criança já está altamente motivada pelas cócegas e demonstra de alguma forma querer mais, este adulto solicita algo desafiador para ela (o papel da criança na brincadeira), como falar uma palavra isolada ou uma sentença, olhar nos olhos, fazer algum gesto ou performance física específica, etc. Lembre-se da importância de trabalhar o olhar nos olhos que é fundamental para a interação. Eu falei disso AQUI . 

O Miguel adora essa priminha,
ela é mais nova que ele.
Aprendemos muito através do contato visual e da interação com as pessoas, isso torna a interação como um dos canais de desenvolvimento, por isso é tão importante melhorar essa interação em nossos filhos. Assim, depois de melhorado o contato visual e a interação, podemos trabalhar muito mais com a criança, ensinando-a outras habilidades e melhorar o desenvolvimento global da criança. Uma pessoa aprende muito mais se estiver olhando e prestando atenção em quem ensina, por isso use a criatividade e chame a atenção com as brincadeiras que ela mais gosta. A socialização não é algo fisiológico que pode ser ser desenvolvida com medicamentos, dietas ou exercícios  físicos, é algo a ser aprendido. Quando dizemos que queremos que nosso filho aprenda habilidades sociais, na verdade estamos almejando algo mais grandioso. Queremos que ele seja capaz de se ajustar ao mundo que o cerca, que seja independente na escola, no bairro, no trabalho e em seus relacionamentos pessoais. Mais do que seguir um livro de regras, ser social é um estado de ser confiante que se desenvolve quando as habilidades de pensamento social são cuidadosamente cultivadas, desde que a criança é pequenininha: Queremos que ela seja capaz de enxergar e vivenciar o mundo com base em outros pontos de vista, e não no próprio ponto de vista, e de encarar essas diferentes perspectivas como oportunidades para aprender e crescer, que seja capaz de lidar com mudanças imprevistas na rotina e nas expectativas, conseguir reconhecer que os erros não são um resultado final, mas sim parte do aprendizado e do crescimento e que as decepções são uma questão de grau, que acreditem nas próprias habilidades para se arriscar a tentar novas coisas, ter respeito e amor próprio para conseguir compreender que os atos e comentários cruéis e irrefletidos por parte de outras pessoas dizem mais sobre elas mesmas do que sobre você. 

Ensinar seu filho a pensar socialmente e ser sociável consiste em um mosaico de milhares e milhares de pequeninas oportunidades de aprendizado que, devidamente canalizados, se fundirão numa base de autoconfiança. É preciso que você, na qualidade de pai ou mãe, seja socialmente consciente em todo tempo, que decomponha a rede de complexidades sociais e lhe ensine as nuanças sociais que ele tem tanta dificuldade de perceber. Mesmo com esse trabalho em desenvolvimento dia após dia, já tenho muito o que comemorar com o Miguel, aliás de uns vinte dias para cá, ele tem interagido tão melhor com a gente que passa o dia todo querendo que eu brinque com ele, não quer brincar sozinho, me chama o tempo todo, aquele garotinho que ficava muito tempo sozinho brincando com legos, agora exige nossa companhia para brincar, e a cada dia tem nos surpreendido com sua evolução.

Assim como todos nós temos de aprender a andar antes de correr, temos de ensinar nossos filhos a “pensar socialmente”.O pensamento social desafia o seu filho a incorporar contexto e perspectiva às suas ações – analisar os aspectos físicos, sociais e temporais do seu ambiente, levar em consideração os pensamentos e pontos de vista alheios; usar a imaginação compartilhada para brincar com um amigo; e compreender que os outros têm pensamentos e reações favoráveis ou nem tão favoráveis a ele, baseados no que ele diz e faz. O pensamento social é a fonte da qual se originam os nossos comportamentos sociais, e essa inteligência socioemocional pode desempenhar um papel mais importante no sucesso do seu filho no longo prazo do que a inteligência cognitiva. Seja paciente e persistente, o sucesso da evolução em seu filho depende também do seu empenho e sua capacidade em continuar a lutar todos os dias. Aprendemos que depois do diagnostico, nossos dias serão de lutas, mas com o tempo vemos que também teremos muitos dias de glória, ainda que não sejam o dia inteiro, teremos momentos de glórias que valerão por uma semana inteira...



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